Para 2011... com a ajuda de um contador de histórias!
Era uma cidade antiga e pequena onde havia as coisas que todas as cidades antigas e pequenas tinham: casas brancas de taipa, janelas e portas de madeira grossa, galinhas e cabras andando pelas ruas, os fogões de lenha acesos o dia inteiro, café com queijo e biscoito de polvilho pelo meio da tarde e cadeiras de vime na calçada ao cair da tarde. E havia também uma banda de música que era a alegria da molecada quando passava e fazia retretas no coreto nas noites de domingo. Vivia também nessa cidade um músico compositor que alimentava a banda com as suas composições. Relata-se que suas composições tiveram um destino inglório. Morto o maestro e não sabendo que destino dar-lhes, a família decidiu deixá-las guardadas no porão. Aconteceu, entretanto, que por descuido de alguém a porta do porão ficou aberta. Um cabrito, passando por ali e vendo a porta aberta, resolveu entrar para ver o que havia dentro do porão. Qual não foi a sua surpresa quando se viu diante daquela refeição deliciosa formada pelas partituras do compositor, que ele devorou inteiras. Conta-se que esse mesmo compositor estava na cama, vivendo seus últimos momentos de vida, toda a família reunida ao seu redor esperando suas últimas palavras e o desfecho. Nesse momento, a banda veio marchando e tocando pela rua do maestro. Foi então que ele, quando a banda passou defronte a sua casa, sofreu um estremeção, seu rosto se contorceu aflito e ele fez menção de que desejava falar. Todos se aproximaram, levantaram-no do travesseiro para que falasse com mais facilidade. E foi isto que ele falou: “A clarineta desafinou o si bemol...”. E morreu.
ALVES, Rubem A morte do compositor In: Do Universo à Jabuticaba, São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2010, p.201-202.
As mensagens enviadas sobre o Ano Novo normalmente vêm repletas de desejos de possibilidades de mudanças...
Na passagem de ano, a contagem regressiva tenta impelir que a esperança renasça talvez ‘das cinzas’ e é com alegria misturada com uma ‘certa tristeza’ que comemoramos a chegada de mais um ano NOVO.
A mistura é reveladora... é como uma pequena faísca (presa na cinza) que evidencia a morte e o nascimento, a perda e a possibilidade.
Nosso contador de histórias nos insere num universo... temos praticamente um endereço... uma casa... temos alimento para o corpo e para a alma... Partituras escondidas no porão para alimentar cabritos e cabras que estão surpresos com o banquete... Opa! Partitura como comida de cabrito?! Cabritos surpresos com o banquete?! Que mistura é esta que o contador de histórias nos faz comer?! Uai, já não somos mais humanos somos quase como cabritos... perdidos sem saber o que nos alimenta... Papel pelo papel... Comida pela comida... Música pela música... Ainda nos resta um suspiro... Estamos agora ao lado de um moribundo compositor... é o corpo, sempre o palco das nossas emoções... da energia vital... que reclama... que se incomoda e busca expressão, rompe com a coisa pela coisa e busca dar viva-voz a um desafino, que se revela particular, a um des-encontro, que sempre estará presente na mistura constante (não só da passagem de ano) entre a perda e a possibilidade!
Neste sentido considerando as rupturas vividas, assim como todas as possibilidades a partir delas, também a serem vividas, é que enviamos a todos que nos tem acompanhado nestes primeiros meses de trabalho no blog nossa mensagem de um FELIZ 2011.!!!!!
Happy New Year !!!!